A “greve” parlamentar que paralisou o plenário da Câmara nesta semana provocou uma reunião de emergência na Presidência da República.
A convite das ministras Ideli Salvatti (Coordenação Política) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil), foram ao Planalto alguns dos principais nomes do petismo no Congresso.
Longe dos refletores, congressistas e ministras do PT travaram um diálogo franco sobre o curto-circuito que eletrifica o condomínio de 14 partidos governistas.
O repórter ouviu dois participantes da reunião. Um deles empregou vocábulo que resume todo o sentido da conversa: “afago.”
Para pacificar os aliados, o governo precisa acarinhá-los, eis a avaliação unânime dos deputados e senadores que foram ao encontro de Ideli e Gleisi.
Soaram na reunião vozes de peso no PT. Dois ex-presidentes da Câmara: Arlindo Chinaglia e João Paulo Cunha. Um ex-presidente do partido: Ricardo Berzoini.
Dois líderes: o do Senado, Humberto Costa; e o da Câmara, Paulo Teixeira. De resto, o futuro candidato da legenda ao governo do Rio, senador Lindbergh Farias.
Os parlamentares reiteraram às duas operadoras de Dilma Rousseff que o Planalto continua padecendo de um déficit de política. Daí a atmosfera de borrasca.
Ficou entendido que negar aos aliados a liberação de emendas orçamentárias e o provimento de cargos é o mesmo que esmurrar ponta de faca.
Gestora do balcão, Ideli pareceu aos interlocutores rendida ao inevitável. Gleisi, nem tanto.
Senadora de primeiro mandato, içada para a equipe de Dilma depois que Antonio Palocci converteu-se no primeiro escândalo da “nova Era”, Gleisi destoou.
Os partidos precisam discutir a agenda que interessa ao país, prega a chefe da Casa Civil. Uma pregação que foi tomada por parte dos que a ouviram como ingênua.
Dona de perfil técnico que a aproxima de Dilma na mesma proporção em que a afasta da política, Gleisi foi alertada do seguinte:
Na negociação com os partidos, é preciso ceder na miudeza para obter o principal. Ou o governo aceita essa lógica ou terá de lidar com aliados em convulsão permanente.
Afora o destravamento de emendas e cargos, os congressistas do PT aconselharam o uso de ataduras para curar as feridas abertas nas últimas semanas.
Recomendou-se, por exemplo, um repactuação com o PR de Alfredo Nascimento, apeado dos Transportes depois que a pasta se dissolveu em malfeitos.
Avaliou-se também que é preciso negar ao PMDB, tisnado junto com o PT no escândalo do Turismo e sozinho no da Agricultura, pretextos que alimentem o ímpeto de rebeldia da legenda.
É a realpolitk, disse ao repórter um dos interlocutores das ministras, evocando a palavra de origem alemã que expressa a inevitabilidade de fazer política com realismo.
Na prática, Dilma é prisioneira do mesmo paradoxo que condicionou as presidências de seus antecessores.
A Brasília pós-redemocratização firmou-se como templo de um sistema administrativo que gira em torno de privilégios, verbas e empregos.
Tancredo Neves teve a sorte de morrer antes de por em prática a armadilha que engendrara. Herdeiro dos acordos, José Sarney honrou-os.
Acossado pelo impeachment, Fernando Collor renovou-os tarde demais. Itamar Franco preservou-os. E Fernando Henrique Cardoso vestiu-os com traje intelectual.
FHC situou o anômalo num ponto qualquer entre as duas éticas de Max Weber, a da convicção e a da responsabilidade.
Ao chegar à Presidência, em 2003, Lula trazia na face a ilusão da novidade.
Dizia-se que, menos inepto que Sarney, mais honesto que Collor…
…Menos transitório que Itamar e mais firme que FHC, Lula teria autoridade para deter a sanha fisiológica.
Deu-se o oposto. Tonificou-a.
O calor de urnas logo se esvaiu no chão frio e escorregadio do dia-a-dia administrativo. A aparência de super-homem derreteu no mensalão.
Dilma vive o mesmo fenômeno. Promote novos padrões morais escorada numa coligação partidária com fins lucrativos, 100% financiada pelo déficit público.
Em essência, o que os congressistas do PT disseram a Ideli e Gleisi é que, esquivando-se de pagar a fatura dos "aliados", o preço é mais alto. Será?
Na próxima terça (16), Ideli almoçará com os líderes governistas de todo o condomínio. Deve levar um cronograma da liberação de emendas. Já dispõe de R$ 1 bilhão.
O governo fará por pressão o que os conselheiros do PT acham que já deveria ter sido feito por conveniência.
Fonte: Folha.com
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