Corpos ainda sem identificação, novo muro, superlotação e promessa de desativação, comunidade assustada e famílias em busca de justiça. A rebelião mais violenta da história do Rio Grande do Norte completa um mês nesta terça-feira (14) com muitas perguntas sem respostas. O governo ainda não sabe quantos morreram ou fugiram, mas foram pelo menos 26 assassinatos e 56 fugas. Relembre como a rebelião começou, e saiba o que o estado tem feito para evitar que o horror se repita.
Penitenciária Estadual de Alcaçuz, Rio Grande do Norte. Sábado, 14 de janeiro de 2017, dia de visita social aos internos. Por volta das 15h (horário de Natal), os presos do pavilhão 4, ligados ao Sindicato do Crime do RN, observavam “algo estranho” pelos “big brothers” – pequenos buracos escavados na parede que dão visão ao pavilhão 5, onde estavam detentos de uma facção rival, o Primeiro Comando da Capital (PCC). Os inimigos andavam livremente, alguns com arma de fogo nas mãos, coletes à prova de bala e até bombas de efeito moral. Quase todos cobriam os rostos com camisas.
Diante da ameaça iminente, alguns internos do pavilhão 4 decidiram subir no telhado. Minutos depois, o pavilhão 5 estava “virado”, ou dominado pelos presos, na linguagem deles. Os detentos já tinham invadido a sala da direção da unidade e o quarto onde os agentes guardavam armas. Mantendo alguns familiares como escudos, eles conseguiram se aproximar do portão que separa os dois pavilhões e, logo em seguida, invadiram a área rival. Iniciou-se aí a maior e mais violenta rebelião da história do sistema prisional potiguar. Pelo menos 26 presos que estavam no pavilhão 4 e que não conseguiram subir no telhado, foram mortos no pátio. Quinze deles foram decapitados. Outros foram esquartejados ou tiveram os corpos mutilados. A penitenciária tinha capacidade para 620 detentos, mas estava com cerca de 1.150.
Um mês depois da matança, a briga entre as facções PCC e Sindicato do Crime (ligado ao Comando Vermelho e FDN), que disputam o domínio das unidades prisionais e o controle do tráfico de drogas no estado, ainda surte efeitos. Após a repercussão internacional do caso, a maior penitenciária do RN passa por uma série de reformas emergenciais e paliativas. Isso porque o governador Robinson Faria (PSD) já anunciou: Alcaçuz será desativada ainda este ano. Nesta sábado (11), a visitação foi retomada.
As causas da rebelião estão sendo apuradas. O secretário de Justiça e Cidadania (Sejuc), Wallber Virgolino, diz que “sistema penitenciário é sinônimo de tensão”. “As pessoas apontam vários fatores, mas sabemos que a falta de efetivo, a falta de estrutura do presídio e o crescimento das facções criminosas contribuem para isso. Trabalhamos apurando se houve facilitação. Se existiu, essas pessoas serão punidas”, afirma.
A mãe de um detento, que prefere não ser identificada, ainda espera que a cabeça do filho, de 23 anos, seja encontrada. A dona de casa conta que desmaiou ao saber da morte dele, o mais velho dos 10 filhos que teve. "Me ligaram e disseram que estava tendo uma rebelião em Alcaçuz. Corri pra lá e, ao chegar, consegui falar com o pessoal que estava dentro e eles disseram que mataram ele. Depois disso eu apaguei".
O filho dela estava no pavilhão 4 e cumpria pena de seis anos por tráfico de drogas. "Está sendo muito difícil ver que meu filho foi embora, Até hoje a gente pede muita força a Deus. Pensava que não ia nunca acontecer comigo. Meu filho foi embora tão novo, 23 anos. Eu não durmo, não como, só lembrando dele", diz ela, com a voz embargada.
A mulher conta que reconheceu o corpo do filho no Instituto Técnico-Científico de Perícia (Itep), enterrou sem cabeça e não teve tempo de se despedir. "Meu filho foi enterrado sem cabeça, arrancaram a cabeça dele lá. Ele foi um dos primeiros, disseram que não conseguiu correr. Até hoje temos esperança de que encontrem a cabeça dele". A mãe diz que o filho tinha estudos e que o homem foi preso ao assumir a culpa no lugar de um amigo. "Ele não merecia morrer assim. Nunca. Ele não tinha inimigos em canto nenhum."
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Fonte: G1 RN
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