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sábado, 9 de março de 2019

PRIMEIRA MINISTRA DO STF FOI CRITICADA POR AMBIÇÃO PROFISSIONAL

Quando Ellen Gracie ocupou uma cadeira no plenário, todas as outras eram ocupadas por homens. Não havia nem banheiro feminino próximo ao plenário.

Quarenta e quatro anos depois de oficializado o Dia Internacional da Mulher, não há como negar: o Judiciário brasileiro ainda é um ambiente masculino. Essa realidade começou a mudar em 2000, quando Fernando Henrique Cardoso nomeou a primeira mulher para o Supremo Tribunal Federal (STF). Quando Ellen Gracie chegou, as outras dez cadeiras eram ocupadas por homens. Não havia banheiro feminino no salão contíguo ao plenário. Precisou ser construído.
Ellen Gracie foi também a primeira mulher a presidir o Tribunal, em 2006. No ano seguinte, colocou em votação a denúncia do mensalão. Discreta, não dava entrevista. Passou a ser criticada pelos colegas pelas costas em 2008, quando candidatou-se a uma vaga de juíza na Corte Internacional de Justiça, em Haia. Não foi escolhida. No mesmo ano, tentou uma cadeira na Corte de Apelação da Organização Mundial do Comércio (OMC). Foi de novo preterida.
Para os outros ministros, a colega desprezava a importância do STF, ao trabalhar com tanto afinco por outros postos. Ela também era alvo de comentários maldosos por suas constantes viagens internacionais, que eram interpretadas como uma forma de se distanciar gradualmente das atividades da Corte. Em 2011, aos 63 anos, Ellen Gracie pediu antecipação da aposentadoria — que só chegaria aos 70 anos, pela regra da época.
Antes dela, outros ministros já tinham tentado postos internacionais. Francisco Rezek é um bom exemplo. Chegou ao STF em 1983. Em 1990, deixou a Corte para comandar o Itamaraty. Dois anos depois, foi nomeado de novo para o Supremo. Em 1997, pediu para antecipar a aposentadoria mais uma vez. Assumiria o posto de juiz da Corte Internacional de Justiça, em Haia. No meio jurídico, ninguém estranhou. Ao contrário, Rezek se tornou referência no Direito Internacional.
Quando Ellen Gracie se aposentou, Celso de Mello fez discurso em plenário: “A presença luminosa da eminente ministra Ellen Gracie no Supremo Tribunal Federal traduz, com notável força e expressiva significação, o reconhecimento de que o processo de afirmação da condição feminina há de ter, no Direito, não um instrumento de opressão, mas uma forma de libertação”.
Passados 19 anos da chegada da primeira mulher ao STF, as outras duas nomeadas na sequência permanecem na Corte: Cármen Lúcia e Rosa Weber. “Às vezes acham que juíza desse Tribunal não sofre preconceito. Mentira, sofre! Há os que acham que isso aqui não é lugar de mulher, como uma vez me disse uma determinada pessoa, sem saber que eu era uma dessas. A mulher foi e continua sendo grandemente sinônimo de sofrimento, de dor”, desabafou Cármen Lúcia em 2012, em plenário.
Em agosto do ano passado, em entrevista ao site Migalhas, Ellen Gracie colocou sua condição feminina em segundo plano ao falar da carreira. “Eu acho que nós devemos nos destacar no meio, seja ele masculino ou feminino, pela nossa competência, e não exclusivamente pelo fato de sermos mulheres”, declarou Gracie. Logo que deixou o STF, ela passou a integrar o Conselho de Administração de uma das empresas de Eike Batista. No fim de janeiro, foi contratada pela Vale para coordenar o comitê da apuração das causas da tragédia de Brumadinho.

Fonte: Carolina Brígido/Época
Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

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