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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

EQUALIZAR: A PALAVA MÁGICA.

"A mudança no PT está em perceber que o Estado não tem possibilidades ilimitadas e sua função é equalizar". A reflexão é do sociólogo Cândido Grzybowski, em entrevista concedida ao IHU On-Line. Ele opina sobre a realização do leilão de concessão dos aeroportos de Campinas, Guarulhos e Brasília e afirma: "Tudo o que mexe com o bem coletivo, comum não pode ser privatizado. Nossa Constituição é muito clara. E essa é uma bandeira de qualquer sociedade. Só que a gestão privada nem sempre dá certo. Porque ela não é regida pelo interesse público, mas pelo interesse da acumulação privada. Se a margem de lucro é grande, é claro que irão fazer o serviço bem feito, o que não é, necessariamente, uma garantia. O Estado tem que ficar "em cima" para que funcione bem. Manteve-se a Infraero com 49% no caso dos aeroportos exatamente para ser um contrapeso nessa concessão. O Estado estará presente, não cedeu totalmente, ou seja, eles não podem fazer tudo o que querem. Essa parceria até deu a maioria para os grupos privados, mas não o poder absoluto". Grzybowski aborda também o tema da estão técnica e da eficiência do Estado, que tem sido marcas fortes do governo Dilma: "o risco da eficiência é tirar do centro a discussão. O que qualifica uma democracia é a participação. Não significa que a melhor solução técnica venha com a participação, mas com certeza será a solução mais legítima. Essa é a diferença".

A privatização retornou à agenda do país? Qual é o significado político da privatização dos aeroportos de Guarulhos, Campinas e Brasília?
Podemos perceber, sim, uma pequena mudança na estratégia de projeto que o Partido dos Trabalhadores - PT tinha, no sentido de ter uma presença maior do Estado. Só que o modelo de privatização adotado não é um modelo de concessão quase gratuita, como foi feito anteriormente. Na verdade, o governo arrecadou muito dinheiro com isso, que pode ser aplicado em outros aeroportos que não têm um sentido comercial e que ninguém quer explorar. Tem essa vantagem. As pessoas têm chamado isso de privatização, mas na verdade é uma concessão para a exploração durante um período; não é entrega de patrimônio, como foi no caso da siderurgia ou da Vale do Rio Doce, onde simplesmente se torrou, tinha-se em caixa só o dinheiro suficiente, e as empresas não entraram com quase nada. Essa é a diferença que vejo. Mas a mudança no PT está em perceber que o Estado não tem possibilidades ilimitadas e sua função é equalizar. Se esse modelo ajudar - porque não sabemos se vai funcionar - e se com aeroportos rentáveis for possível financiar aeroportos não rentáveis, mas fundamentais para fazer o serviço à população, então é um bom modelo. Mas se for para fazer caixa e daí torrar em qualquer outra coisa, daí não é um bom modelo.

Qual a diferença entre privatização e concessão, no caso dos aeroportos?
A Constituição determina que tudo o que envolve infraestrutura tem que ser tratado como bem comum. E pode ter o Estado como gestor de portos, aeroportos, estradas, porque são espaços comuns, da coletividade. Não tem como privatizar isso, não dá para conceder propriedade disso. A concessão é para explorar esses espaços, sempre com contrapartida. Por exemplo, a água é outro caso de bem público, que pode ser gerido de forma estatal ou de forma privada. O problema é que a iniciativa privada se interessa só onde há lucro. E sobra para o Estado onde não dá lucro, não permitindo fazer a tarifa social. É essa a diferença entre ser controlado direto pelo Estado e não ser. Quando se faz a concessão, se admite a possibilidade de ganhar lucro sobre um bem comum. No caso dos aeroportos, a contrapartida exige investimentos pesados, que não sabemos se a iniciativa privada vai dar conta de fazer. Tudo o que mexe com o bem coletivo, comum, não pode ser privatizado. Nossa Constituição é muito clara. E essa é uma bandeira de qualquer sociedade. Só que a gestão privada nem sempre dá certo. Porque ela não é regida pelo interesse público, mas pela acumulação privada. O Estado tem que ficar "em cima" para que funcione bem. Manteve-se a Infraero com 49% no caso dos aeroportos exatamente para ser um contrapeso nessa concessão. O Estado estará presente, não cedeu totalmente, ou seja, eles não podem fazer tudo o que querem. Essa parceria até deu a maioria para os grupos privados, mas não o poder absoluto.

Mas não seria uma contradição do governo do PT tomar essa medida, tendo em vista todo o histórico de militância do Partido em relação às privatizações?
Contradição é, principalmente em relação ao que eles diziam. Eles foram contra concessões de estradas, por exemplo, e já fizeram essas concessões também. No entanto, o modelo que estão adotando é mais interessante do que o do governo anterior. Na questão das estradas que foram concedidas para grupos privados, a tarifa é um terço ou um quarto daquelas que os tucanos fizeram. Essa é a diferença. A remuneração do setor é um pouco mais regulada, no sentido de obter um possível lucro. A concessão absoluta, assim como se fez em algumas áreas, é uma loucura. Privatização mesmo é patrimônio passado adiante. Um exemplo de privatização é o das siderúrgicas, inclusive foi usada moeda podre na época, aqueles papéis de governo que não valiam nada. Teve gente que não tinha dinheiro e ficou rico, como o Eike Batista, por exemplo, que tinha informação privilegiada e participou das privatizações. Nesse tipo de situação eles estão sendo mais zelosos hoje. Mas que há uma contradição entre o que pregavam quando eram oposição, com o que fazem agora, isso há.

A junção do leilão da privatização dos aeroportos coincide com o discurso de Dilma pela eficiência do Estado. A "gestão técnica" pode estar se sobrepondo ao projeto político?
O projeto político também pode ser tecnocrático. A meta de ser eficiente pode afetar a participação e não invade os setores da política. É como achar que o Estado sabe o que fazer e não precisa consultar, negociar ou envolver os usuários. Por exemplo, nós somos usuários dos aeroportos e ninguém falou sobre isso. O tema não foi para o Congresso. Foi uma decisão técnica, dentro do governo, e se fez a privatização. Nem os sindicatos foram ouvidos. O risco da eficiência é tirar do centro a discussão. O que qualifica a democracia é a participação.

A privatização dos aeroportos com a forte entrada dos fundos de pensão e recursos do BNDES repete o modelo do período FHC ou há alguma novidade?
Nisso não mudaram nada. A diferença que existe é que não se trata de diminuir o Estado. O discurso que havia antes era do "Estado inchado", de que era preciso diminuir o Estado. Isso passou e não quer dizer que melhorou muito. O que preocupa aqui é a forma e todo o cuidado de regulação do Estado nessa concessão dos aeroportos. Essa é uma grande diferença: a preocupação em que o atendimento ao público seja o mais eficiente. Até podemos questionar se realmente vai ser.

O movimento sindical acusa o governo de ter entregue o "filé mignon" dos aeroportos para a iniciativa privada. A Infraero é mesmo incapaz de gerir os aeroportos?
De fato, o governo entregou o filé mignon. Mas a Infraero, por definição, tem que dar conta do osso mais duro ao filé mignon. E pode fazer isso com orçamento público, porque não é gerida pela ideia do lucro. Ela pode estar não fazendo o que é necessário em certos aeroportos, onde há demanda maior, porque precisa zelar para que também o aeroporto no Piauí ou em Passo Fundo funcione também.

O sr. participou do Fórum Social Temático em Porto Alegre. Qual é o balanço que faz do evento?
Quando pensamos em fazer um fórum temático, a ideia era aprofundar questões em vista da Conferência Rio+20. Do jeito que ficou, acabou parecido a outros, não ficou tão temático assim. Fizeram-se atividades como em qualquer fórum, mas como se fosse um fórum local. Eu poderia citar vários problemas. Um deles é que era para ser um evento temático e foi uma contradição, pois teve muito pouca gente. Mas foi oportuno, vai impactar naRio+20, porque despertou interesses em redes mundiais. No entanto, podia ter sido melhor. Eu defendia que todas as atividades auto-organizadas girassem em torno dos mesmos temas, no sentido de aprofundá-los. Na verdade, não foi isso o que ocorreu.

Fonte: Tribuna do Norte

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