Pedagoga e mestre em Educação, a secretária estadual da pasta, Betânia Ramalho, avalia o atual momento do setor no Rio Grande do Norte, chamando a atenção para a necessidade de um diálogo permanente entre professores e o governo, achando, inclusive, que ação político-partidária dentro do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte-RN) atrapalha a discussão em torno de uma política de resultados. Ela admite que a própria Seec precisa de uma reestruturação, até de inversão de prioridades, de forma que, ao invés de a escola ir à Secretaria, esta é que tem de ir ao encontro dos interesses das escolas.
Como secretária, a senhora tem feito uma série de viagens a Brasília, o motivo é a busca de recursos para a área de Educação do Rio Grande do Norte?
Na verdade não são apenas os recursos, todos os estados têm um fórum de secretarias que tem uma pauta mensal, referente aos problemas comuns das secretarias, os projetos do governo federal em andamento e as reivindicações dos estados. Há uma discussão muito forte sobre a implantação do piso salarial nacional dos professores, esse tem sido um tema recorrente.
O que tem sido discutido sobre o piso nacional?
Estamos conversando sobre a incidência do piso nacional no conjunto dos planos de cargos. É o governo deliberar por um piso, que é aceito por todos os secretários estaduais de Educação, no entanto esse piso tem repercussões diferenciadas no conjunto dos estados, principalmente na região Nordeste, é onde tem um menor avanço no plano de cargos e salários, que os estados deveriam ter avançado quando foi implantado, e isso necessariamente não ocorreu porque o magistério é a maior categoria. Há uma série de questões que precisam ser revistas dentro da categoria. Ela fica mesclada entre os professores ativos e inativos. No caso do Rio Grande do Norte, os inativos dentro do conjunto dos professores ativos, porque todas as vantagens salariais que incidem nos ativos e incidem nos ativos também, que deveriam estar no setor da previdência, porque pagaram a previdência. Têm a questão da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), todas as universidades estaduais já deveriam ter logrado a sua autonomia, como alguns já fizeram. O que se discute também é a qualidade da educação, as demandas são crescentes, é um conjunto de questões, que em síntese é uma grande discussão a qualidade da educação.
Como o governo federal faz para contribuir com relação a todas essas demandas da Educação?
O governo federal faz as análises, procura contribuir com o Fundeb que é formado com um bolo de recursos passados pelos estados e municípios, depois o governo federal divide e repassa para os estados e para municípios. O governo federal tenta ir até onde ele pode. Tem programas pra tudo no Ministério da Educação, no entanto por uma falta de organização e de um planejamento mais permanente, nós temos muita descontinuidade de projetos na educação em todos os níveis de governo - federal, estadual e municipal.
E aqui no RN, qual a realidade?
No caso do Rio Grande do Norte, chegamos há seis meses e encontramos uma Secretaria de Educação completamente desorganizada, desde a estrutura técnica e administrativa até a ausência de um planejamento que pudéssemos dar continuidade. Chegamos em janeiro e nada tinha sido planejado para as aulas que iam começar em 14 de fevereiro, por exemplo. Nem o diário de classe, que é algo previsível tinha sido elaborado. Não é só uma questão de falta de recursos, é também uma questão de ineficiência na gestão dos recursos financeiros e de falta de planejamento estratégico para a educação.
O orçamento para a educação é suficiente ou precisa mais de recursos para o seu gerenciamento?
Claro que precisamos de mais recursos, educação de qualidade não se faz com poucos recursos. Mas a primeira coisa que precisamos é equacionar o problema da carreira da educação, que ao longo dos anos, no Brasil inteiro e não só no Rio Grande do Norte, reconhecidamente pela sociedade, é a categoria, vamos dizer assim, menos contemplada. Aqui no RN existe um plano de carreira que foi criado em 2006, já tardiamente. Então, ele vive um histórico de situações desencontradas, de reivindicações que quando são atendidas, não contribuem para o avanço da categoria, para a construção de um plano de carreira onde fique muito claro todas as regras, as vantagens da trajetória dos professores, mas também dos direitos e dos deveres.
O plano atual é satisfatório para a categoria?
O plano de cargos em vigor não é suficiente, acho que ele precisa de revisão. Existe um plano construído pela categoria, mas se confrontamos o plano em vigor e o plano almejado há uma distância enorme de reivindicações. É impossível para qualquer governo de uma hora para outra, sem um planejamento e um estudo construído com o sindicato e com os professores, construir uma carreira mais respeitosa para a categoria e viável para o Estado. A gente está vivendo isso no Estado, todos os planos de cargos aprovados sem a elaboração de uma estimativa de impacto financeiro. Se o piso salarial nacional está gerando um impacto complicado principalmente junto aos estados do Nordeste, foi porque não houve um estudo prévio.
Mas, o governo federal fala que quando os estados e municípios não tiverem recursos suficientes, a União faz uma complementação?
O problema da complementação é que muitas vezes para se ter a complementação precisa ter determinados critérios. No Rio Grande do Norte nós temos esses critérios e o governo complementa, mas não no todo, até porque no Estado o número de professores que não ganha o piso é muito pequeno, esse não é o problema. No nosso caso, qual é o impasse hoje, é que se está saindo de um piso de R$ 668,00 para R$ 890,00, é uma categoria muito pequena, dois mil professores, esse não é o problema, isso é pouco. O problema é que pega um reajuste de 34% e tem de escalonar para todos os níveis e dez letras. Esse é o impacto que estou falando. Chegamos e com pouco mais de três meses se decreta uma greve. Então, negociamos janeiro, fevereiro e março. Em abril, colocamos para o sindicato uma proposta para que construíssemos juntos esses reajustes para dar o piso e o escalonamento. Pedimos três meses, porque na desorganização administrativa que nós temos, os números financeiros eram desfavoráveis, tanto do quadro dos professores que estão na ativa, os inativos. É uma desorganização e as contas numéricas nossas não batem com as contas da administração. Por causa de toda essa desorganização pedimos essa trégua, porque acreditamos que pudéssemos sair do impasse definitivo e que os alunos não continuassem sendo os únicos prejudicados. A resposta foi o quê? A greve no dia 2.
E a questão dos professores que estão fora da sala de aula, são muitos, como a secretaria vai fazer para solucionar isso aí?
Quase 50% deles está fora de sala de aula. É um percentual alto em razão de um plano de cargo que não está atualizado, porque todos que atuam em sala de aula são professores. Todas as contratações aqui são para professor. Não se tem a contratação para diretor, vice-diretor, para coordenador pedagógico, para o profissional que vai atuar na biblioteca, no laboratório de informática... Não tem a contratação, tem o cargo para diretor e vice-diretor, que são os gestores e se tira da sala de aula para a burocracia. Então, precisamos avançar no plano de cargos, porque precisamos ter não só o cargo, mas a função também. Por isso se explica em parte o número de professores fora da sala de aula. Tem aqueles que estão cedidos, têm os readaptados, que por alguma razão de saúde estão executando outras tarefas... Tudo bem, isso é previsível. No entanto, precisamos ter regras para isso.
E com relação aos inativos?
Eles têm de sair da folha da educação e entrar para o instituto da previdência, então com isso a gente vai diminuir os gastos e ampliar os investimentos e a gente vai poder estar construindo mais essa carreira.
O problema da educação é só salarial?
Não é possível que os resultados da educação estejam atrelados apenas aos salários, que é apenas uma condição. Também estamos encontrando escolas muito precárias, que não têm um planejamento de manutenção, ai fica difícil se garantir que a escola seja ativa e conte com as verbas necessárias.
O governo estadual está investindo 25% do orçamento na educação, como manda a Constituição Federal?
Todos os estados são obrigados, o Rio Grande do Norte investe quase 28%.
Diante de um já conhecido conjunto de dificuldades, mesmo não resolvendo de uma vez, quais as metas da educação para os próximos anos?
A grande questão é o planejamento e a reestruturação inclusive da Secretaria na parte física e administrativa e técnica, mas uma reestruturação do conhecimento dos problemas da educação para que a gente consiga reverter à lógica, a Secretaria tem que estar á disposição da escola, acompanhando, subsidiando, apoiando essa escola, e não a escola vir em busca da Secretaria para resolver os seus problemas. Temos que inverter a lógica em primeiro lugar, porque o projeto da educação tem focalizar o ensino e aprendizagem, o trabalho do professor, o acompanhamento pedagógico para que haja aprendizagem, sem isso estamos falhando, nos omitindo, educação não significa só colocar aluno em sala de aula, não significa colocar professor.
Como a Secretaria vai reverter o problema constante da falta de professores em sala de aula, principalmente de disciplinas como Matemática, Física, Química...?
O concurso só em si não garante, porque o problema é mais na área da Ciência que tem carência no mundo inteiro, como já se abriu concursos no passado e não aparece. Nem todos têm uma inclinação porque é uma área de abstração muito forte, ter um nível de conhecimento e de habilidades de Matemática muita elevado a para Física, Química e junta isso a questão de mercado, com a baixa atratividade de uma profissão. Não tem a recompensa que um professor precisa. O concurso ainda não está marcado o mês e vai ser para uma duas mil a 2.500 vagas, estamos definindo o quantitativo de disciplinas, mas gostaria de adiantar que como todos esses problemas têm uma interferência muito forte no conjunto da educação do estado, não podemos esperar que o concurso resolva os problemas.
A senhora vem de uma universidade federal, com uma realidade bem diferente da Educação do Estado. Como a senhora enfrenta esse desafio?
Primeira coisa, é, realmente, um grande desafio. Acho que o que me motivou foi a possibilidade de fazer alguma coisa pela educação do Estado, que está em uma situação que nos incomoda muito. É muito confortável estar numa universidade, onde sou professora titular, tenho uma trajetória de trabalho. Aqui é uma outra dinâmica, que consume muito tempo e muito trabalho. Mas decidi vir para cá e o que me move é o espírito de contribuir.
E como o governo pretende superar esses dias sem aulas, recuperar o ano letivo, praticamente perdido?
Não, não está perdido. As aulas serão respostas, isso é inegociável, porque o direito do aluno tem de ser garantido, do conhecimento, da informação, às 800 horas, aos 200 dias letivos, porque isso é um direito constitucional. Nós também temos de negociar para que nos próximos anos os alunos não sejam colocados na "condenação" que são as greves, que levam a um prejuízo irreparável, este ano teremos a "provinha Brasil", o Enem, imagine os alunos que vão postular uma vaga no ensino superior, os vestibulares, ficam em desvantagens, porque são reféns da greve. O que eu almejo é construir uma mesa de negociação permanente com os professores, para ver se a gente consiga um planejamento de médio prazo, pelo menos de quatro anos e ver se a gente atende as reivindicações dos professores, porque, a não ser isso, ficar cada vez mais refém da greve, que é imprevista, porque o sindicato tem o seu modo de operar e está muito influenciado por questões políticas e partidárias, e não estão discutindo os resultados da educação e porque o Rio Grande do Norte sempre fica nos últimos lugares em índices de produtividade.
Fonte: Tribuna do Norte
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