Na tarde da quarta-feira (2), o presidente Michel Temer estava sentado no sofá da ampla sala de estar de seu gabinete no Palácio do Planalto. Acompanhava o que acontecia dentro da Câmara pela televisão de 72 polegadas e ao telefone, pelos relatos dos ministros que enviou ao plenário para convencer deputados – a todo custo – a livrá-lo de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção passiva. Ficou satisfeito ao acompanhar o desempenho da primeira bancada, de Roraima. O elixir da velha política, composto de liberação de emendas e cargos, surtia efeito. Em junho e julho, Temer havia liberado para cada um dos roraimenses até R$ 10 milhões em emendas. Dos oito integrantes da bancada, obteve apenas um voto contrário. Mas veio a bancada do Rio Grande do Sul para azedar o humor, com xingamentos de “Temer corrupto”, e, o pior, as traições.
O deputado Luis Carlos Heinze, do aliado PP, assumiu o microfone e, para surpresa do presidente, votou por seu julgamento. “Ele esteve aqui comigo! Não vou ficar mais vendo isso”, disse Temer, entre chocado e irritado. Levantou-se do sofá resmungando que não queria mais acompanhar o voto a voto. Deixou na sala alguns correligionários que lhe faziam companhia, como o ministro Sergio Etchegoyen, do Gabinete de Segurança Institucional, e Torquato Jardim, da Justiça. Foi para uma sala privada, contígua à sua, menor – e sem TV. Heinze havia estado cara a cara com o presidente, a última visita delas em julho, às vésperas da votação, e jurou-lhe fidelidade. Integrante da bancada ruralista, beneficiada dias antes com uma renegociação de dívida de produtores, o deputado havia tratado com o governo a transferência de R$ 7,8 milhões para suas emendas somente nos últimos dois meses. “Ali é o seguinte. Este voto foi um caso específico. Mas eu voto com o governo. Eu estive com ele, fui ao Banco Central, Planejamento, Conab, mas tudo em nome dos produtores de arroz. Não é nada para mim”, disse, às gargalhadas, ao saber da reação do presidente.
Temer só saiu do isolamento por volta das 20 horas, quando foi avisado que já havia conseguido os 172 votos redentores. Foi um alívio. Ele permanecerá no cargo por pelo menos mais um mês. A próxima batalha deverá acontecer em setembro, quando o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviará nova denúncia à Câmara, desta vez por obstrução da Justiça. Mesmo com um placar mais modesto do que governistas anunciavam – 263 votos favoráveis e 227 contrários –, a vitória custará caro aos brasileiros. Só no mês de julho, foram empenhados mais de R$ 2 bilhões para deputados gastarem em suas bases eleitorais. Nunca foi tão fácil: todo parlamentar que pediu levou. Os acertos seguiram ainda com a votação em curso, a fim de convencer quem ainda se mostrava indeciso. Naquela tarde da quarta-feira, dia 2, o ministro da Saúde, Ricardo Barros, que não foi exonerado do cargo para votar pelo presidente e, portanto, estava investido do poder de chefe da Pasta, transferiu seu gabinete da Esplanada para dentro da liderança do PP na Câmara. “Em vez de receber [parlamentares] lá, eu recebo aqui, ué”, disse a ÉPOCA. E armou ali seu balcão de atendimentos. O deputado Paulo Henrique Lustosa (PP-CE) chegou ao “puxadinho” de Barros no PP e comentou com funcionários: “As coisas estão caminhando. Tem de insistir sempre, não é?”. Em resposta, ouviu de um servidor: “O líder [Arthur Lira] já falou com ele [Barros]. Está tentando liberar tudo”. O ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy (PSDB-BA), também foi enviado ao Parlamento para desempenhar o mesmo papel. Circulou dentro do plenário com uma planilha nas mãos conferindo pleitos dos deputados e computando votos. Negociou ali mesmo, a céu aberto.
Fonte: Débora Bergamasco e Patrick Camporez/Época
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