Entre propostas da CNB está a redução da influência de marqueteiros no PT e mudanças na política econômica.
Maior corrente interna do PT, da qual participa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a tendência Construindo um Novo Brasil (CNB) propõe uma mudança radical na estrutura de funcionamento administrativo, eleitoral e político do partido. Nas palavras de um dirigente petista, a CNB quer aproveitar as mobilizações de junho para propor uma volta às raízes e, com isso, se aproximar dos movimentos que lideraram os protestos.
Na tese de 11 páginas que embasa a candidatura da CNB ao Processo de Eleições Diretas (PED) de novembro, a corrente propõe uma série de medidas inéditas como:
– revisão do funcionamento do Diretório Nacional aproximando o modelo à estrutura horizontal dos coletivos digitais que lideraram as manifestações.
– desvincular os quadros partidários da burocratização e da dependência excessiva do aparelho estatal.
– redução da influência dos marqueteiros na comunicação petista.
– unificar os partidos de esquerda e isolar as forças “autoritárias, elitistas e golpistas”.
– construir uma “hegemonia” política “para muito além das dimensões eleitorais”.
– defender a tarifa zero nos transportes, principal objetivo do Movimento Passe Livre, como meta de médio prazo.
– mudanças na política econômica do governo com o aumento dos gastos públicos.
O texto intitulado “O Brasil quer mais e melhor” começa com um diagnóstico. “As manifestações ocorridas em junho colocam novas indagações e exigem do PT uma reformulação positiva de sua estratégia partidária”.
O documento lista os avanços obtidos nos governos Lula e Dilma Rousseff, mas admite que é pouco. “O que foi feito não é suficiente (...) claro está que a distribuição de renda e o acesso ao consumo não bastam para impulsionar a emancipação das pessoas”.
A saída, segundo a CNB, é tratar os jovens como “sujeitos diretos” e melhorar a comunicação. Neste item o texto dá uma alfinetada em marqueteiros como João Santana e Duda Mendonça que passaram a ter mais poder do que militantes e dirigentes desde a eleição de Lula em 2002.
“Nossa comunicação não pode e não deve ser comandada pelos referenciais do marketing, mas pela perspectiva política que não se atém, apenas, às vitórias eleitorais”.
Apesar de as pesquisas mostrarem que a aprovação a Dilma desabou depois dos protestos, a CNB enxerga nos protestos uma oportunidade de guinada à esquerda tanto do partido quanto do governo. “A situação política que surge abre nova oportunidade ao PT”, diz o documento. “As manifestações contribuem para que o governo da presidenta Dilma avance em direção às transformações das quais o país precisa”.
Para isso, no entanto, o partido terá que rever práticas e hábitos adquiridos e enraizados na cultura petista nos últimos anos, como, por exemplo, a burocratização dos quadros partidários e a dependência excessiva das estruturas de poder. “Cabe ao PT enfrentar de uma só vez os riscos da excessiva burocratização e vinculação de seus quadros com aparelhos de Estado”, diz o item 38 do documento.
Outra tarefa é a reaproximação com movimentos sociais, em especial os novos coletivos que lideraram as manifestações de junho para garantir apoio político além das alianças com partidos de centro e direita que marcaram os últimos anos. “O PT tem a tarefa de sedimentar uma prática dialógica de construção de hegemonia em relação a nosso projeto estratégico para muito além das dimensões eleitorais (...) lutar para fortalecer no Brasil o diálogo, canais de participação social, política e cultural existentes, estar em sintonia com as novas experiências de organização que têm surgido na sociedade”.
Um dos trechos mais radicais diz respeito à mudança na estrutura administrativa do PT, tanto do diretório nacional quanto das bancadas parlamentares. “O Diretório Nacional deverá rever seu funcionamento seja criando grupos de trabalho horizontais, multitemáticos que elaborem e consolidem formulações em áreas fundamentais, seja trazendo para sua pauta não apenas os temas conjunturais imediatos”.
Os diretórios municipais devem “se tornar espaços político-culturais de diálogo, convivência e troca de experiências”.
De forma indireta o documento engrossa as críticas à política econômica do governo ao cobrar novas formulações para viabilizar mudanças mais profundas.
No item 36, alínea “e”, “o PT defende o transporte coletivo como direito fundamental e acredita que a tarifa zero, como meta social de médio prazo, possa ser uma política qualificada”.
Integrantes de outras correntes criticam o texto porque, embora reconheça falhas do governo e do partido, a CNB em momento algum faz uma autocrítica. A corrente controla o PT há mais de 20 anos, período em que o se afastou de suas bandeiras originais. Líderes da CNB como José Dirceu e José Genoino foram os arquitetos da mudança do partido de massas para a máquina eleitoral pragmática que venceu as últimas três eleições presidenciais com a utilização de métodos antes criticados como o caixa dois eleitoral.
Também foram integrantes da CNB, antes chamada Campo Majoritário, os responsáveis pelo maior escândalo da história do PT, o mensalão, entre eles Delúbio Soares, Sílvio Pereira e João Paulo Cunha. O texto também não cita o fato de que outras correntes culparam o Campo Majoritário pelo escândalo e que, por isso, a corrente mudou de nome em 2005.
Além da CNB assinam o texto as correntes PT de Lutas e de Massas (PTLM) e Novos Rumos, da qual faz parte o presidente nacional do partido e grande favorito à reeleição, Rui Falcão.
Fonte: Ricardo Galhardo - iG/Último Segundo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
COMENTÁRIO SUJEITO A APROVAÇÃO DO MEDIADOR.