O mundo jurídico foi surpreendido, novamente, com uma decisão liminar, no mínimo estranha, proferida pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, suspendendo a tramitação do Procedimento de Investigação Criminal (PIC) instaurado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro em face do policial militar Fabrício José Carlos de Queiroz, que era assessor parlamentar de Flávio Bolsonaro na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro).
O referido PIC tinha por escopo apurar movimentação financeira “estranha” nas contas de Queiroz no valor de R$ 1, 2 milhão no período entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, o qual corresponde à época em que era motorista do filho do presidente Bolsonaro.
Vice-presidente do STF e ministro de plantão durante o recesso do Judiciário, Fux atendeu a pedido do deputado estadual e senador eleito Flavio Bolsonaro, parasuspender provisoriamente, até que relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, as investigações desenvolvidas pelo Ministério Público Fluminense, retornar a suas atividades após o recesso.
Ressalte-se, por oportuno, que a ausência de publicidade do ato judicial, além de aguçar a curiosidade dos cidadãos, permite que os operadores do direito levantem algumas dúvidas quanto à pertinência e a correção da medida tomada, mesmo porque a Reclamação foi ajuizada por Flavio Bolsonoro, ao que se sabe, não é investigado pelo Ministério Público.
Caberia ao clã Bolsonaro vir a público e esclarecer qual a fundamentação esposada do referido instrumento constitucional, que tem hipótese de cabimento restritas, senão vejamos:
a) para preservar a competência dos tribunais superiores;
b) para a garantia da autoridade de suas decisões;
c) contra decisão judicial ou ato administrativo que contrariar, negar vigência ou aplicar indevidamente entendimento consagrado em súmula vinculante; e
d) para garantir a observância de acórdão proferido em julgamento de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de incidente de assunção de competência.
Tudo indica que seja por conta de Flavio Bolsonaro ter se diplomado Senador da República, o que, em tese remeteria a investigação, diante do foro por prerrogativa de função do Supremo Tribunal Federal.
Ocorre que a Corte Suprema, em 3 de maio de 2018, por maioria de votos, prevaleceu entendimento do ministro Luís Roberto Barroso, que foi acompanhado pelos ministros por Rosa Weber, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Luiz Fux, Marco Aurélio Melo e Celso de Mello, de que o “foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas”.
Não se pode olvidar que as investigações deflagradas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro tiveram sua gênese nas informações fornecidas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, consistentes em movimentações financeiras incompatíveis do motorista de Flávio Bolsonaro, bem como a existem de supostos funcionários fantasma e saques em dinheiro realizadas por assessores do parlamentar fluminense.
Dessa forma, tendo em vista que a única hipótese plausível para a impetração da Reclamação, na espécie, é para preservar a competência dos tribunais superiores, a decisão liminar do ministro Fux afrontou a decisão exarada pela maioria do Supremo, inclusive o entendimento do próprio ministro, na Ação Penal 937, uma vez que os fatos ocorreram no período em que era Deputado Estadual, o que afastaria a prerrogativa de função e a atração da presidência das investigações para o STF.
Assim, ficam no ar as seguintes indagações: o ministro Luiz Fux decidiu contrariando o princípio da colegialidade que tanto defende? São dois pesos e duas medidas de acordo com o freguês? Qual seria a visão do Ministro Sergio Moro neste estranho episódio?
Segundo apontado pelo jornalista Gerson Camaroti, a cúpula das Forças Armadas e o Ministro do Gabinete Segurança Institucional, General Augusto Heleno, se mostraram desconfortáveis com o pedido manejado pelo Flávio e com a decisão liminar.
Por enquanto, permanece a estranheza no imaginário dos cidadãos brasileiros!
Fonte: Marcelo Aith é especialista em Direito Criminal e Direito Público/Blog do Barreto
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