Ali Mokdad dirige parte das projeções feitas pelo IHME, instituto de métrica da Universidade de Washington utilizado pela Casa Branca como um dos principais modelos para monitorar Covid-19.
Desde o meio de maio, Mokdad e sua equipe acompanham o avanço da pandemia no Brasil e suas conclusões são bastantes sombrias. Na segunda-feira (25), o instituto atualizou para cima a expectativa de mortes pela doença no país: de 88 mil para mais de 125 mil óbitos previstos até agosto.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, Mokdad diz que a tendência de casos e mortes no país é de alta e que a situação pode ser ainda pior se governo e população não levarem a crise a sério e adotarem "lockdown" por duas semanas.
"As infeções e mortes vão crescer e, o mais assustador, haverá a sobrecarga total do sistema de saúde." Caso cumpra o confinamento total por 14 dias, explica Mokdad, o Brasil conseguirá controlar a propagação do vírus e poderá fazer a reabertura das atividades econômicas de maneira estratégica -e até mais rapidamente.
Especialista em saúde pública, diz sofrer críticas por ter um modelo que varia bastante, mas, no caso da pandemia, prefere que suas projeções se ajustem com o tempo. "Se os brasileiros ficarem em casa por duas semanas, meus números vão baixar. E não porque fiz algo errado, mas porque os brasileiros fizeram algo certo."
PERGUNTA - Qual a situação da pandemia no Brasil?
ALI MOKDAD - Infelizmente o que vemos no Brasil é uma tendência de aumento de casos, que vai resultar no crescimento das mortes no país. Isso se dá por várias razões. Primeiro porque o país não entrou em "lockdown" cedo para impedir a propagação do vírus. O governo e a população brasileira não levaram isso a sério e não fizeram logo as coisas certas para impedir a transmissão do vírus.
Segundo, há muita disparidade no Brasil e a Covid-19 aumenta isso. Nesse caso, é preciso proteger não só os trabalhadores de saúde mas os trabalhadores de serviços essenciais, pessoas pobres que trabalham em funções que as obrigam a sair de casa. Elas não estão protegidas e estão morrendo. A terceira e mais importante preocupação é a sobrecarga do sistema de saúde. Se o país não agir, vai haver mais casos no inverno e não haverá tempo para se preparar. É perigoso e arriscado. Se você colocar tudo isso junto, o Brasil ainda vai enfrentar sérias dificuldades diante da Covid-19.
P. - Em duas semanas, o IHME aumentou as projeções de morte no Brasil de 88 mil para mais de 125 mil até agosto. O que aconteceu?
AM - Adicionamos mais estados [de 11 para 19] na nossa projeção, isso é uma coisa. Mas estamos vendo no Brasil mais surtos e casos do que esperávamos. O país está testando mais e encontrando mais casos, mas, mesmo quando ajustamos para os testes, há uma tendência de alta.
No Brasil há também um erro de suposição quando falamos de circulação. Os dados [de mobilidade da população] são baseados no Facebook e no Google, ou seja, em smartphones, ou seja, em pessoas mais ricas. Percebemos que a circulação não parou nas favelas, por exemplo, em lugares onde pessoas mais pobres precisam sair para trabalhar. Se as pessoas se recusarem a levar isso a sério, infelizmente vamos ver mais casos e mortes.
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Fonte: Folhapress
Foto: Web
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