Depois de ter participado da elaboração da lei que barra a candidatura de políticos com antecedentes judiciais, o advogado Márlon Reis está agora engajado em outro movimento cujo objetivo é assegurar eleições limpas. Mais exatamente, Reis, que faz na próxima segunda-feira, a partir das 19h30, palestra sobre o tema "A luta por eleições limpas" no salão nobre da Faculdade de Direito de Sorocaba (Fadi), participa dos debates em torno da proposta de reforma política.
A vinda do jurista à faculdade é uma iniciativa do Instituto Defenda Sorocaba (IDS) e tem o apoio da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª Região (Amatra 15) e da subseção local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). As inscrições podem ser feitas pelo endereço eletrônico administrativo@amatra15.org.br. Para participar, é necessário doar um quilo de alimento não-perecível (exceto açúcar e sal). O produto da arrecadação será doado ao Lar Escola Monteiro Lobato e ao Instituto Humberto de Campos.
Ontem, Márlon Reis concedeu entrevista ao Cruzeiro do Sul na qual defendeu a cassação do mandato do presidente Michel Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) diante das irregularidades apuradas na prestação de contas. O relator do processo já cogitou a possibilidade de que isto ocorra.
Ele também definiu o caixa 2 como "prática completamente abjeta, que deve ser banida da realidade política do Brasil". "Não há caixa 2 menor ou menos relevante. A utilização de dinheiro não declarado nas campanhas, sempre está a revelar a utilização de verbas provenientes de fontes ilícitas. Vários crimes estão relacionados a isso, como lavagem de dinheiro, peculato, dentre outros crimes contra a administração pública", destacou. Confira a entrevista.
CS - Para alguns, a Lei da Ficha Limpa não teria alcançado seus objetivos plenamente. O que se pode esperar da nova frente pelas eleições limpas?
Márlon Reis - Na verdade, a Lei da Ficha Limpa ultrapassou muito os seus objetivos. Além de haver estabelecido pela primeira vez regras rigorosas de definição de candidaturas, ela mudou a vida da sociedade em vários aspectos que sequer são bem conhecidos. Um exemplo é o fim da possibilidade de se renunciar a mandatos para escapar de cassações, algo que era frequente no passado. Desde a edição da Lei da Ficha Limpa não temos mais renúncias de deputados descobertos em escândalos, por causa da Lei da Ficha Limpa. Esse é só um exemplo das grandes mudanças que a lei trouxe para a sociedade. E o mesmo deve acontecer com a frente pelas eleições limpas.
O relator do processo que analisa no TSE as contas da chapa Dilma/Temer já admitiu a possibilidade de cassação do mandato do presidente. O que se pode esperar desse julgamento?
Márlon Reis - Pelo volume de provas produzido no processo de cassação da chapa Dilma/Temer, entendo que a solução mais justa passa pela condenação de ambos, seguida pela declaração de inelegibilidade tanto para um, quanto para outro. O correto, a meu sentir, é que o TSE promova a efetiva cassação do presidente Temer e convoque novas eleições presidenciais. Seria a solução mais legítima e adequada para a crise.
A proposta de reforma política que está no Congresso não só mantém, como amplia os recursos do financiamento público de campanhas eleitorais. Como interpreta essa medida?
Márlon Reis - Todas as democracias avançadas fazem uso de verbas públicas para financiar a política. É uma maneira de tornar os partidos menos dependentes de doações empresariais ou de utilização de recursos ilícitos. Entretanto, peca-se no Brasil pela falta de transparência no uso desses valores. Os partidos utilizam essas verbas como se fosse dinheiro particular, quando na verdade está em jogo o interesse da sociedade que financia os partidos e campanhas. Não vejo, por outro lado, necessidade de aumentar o valor disponível para o financiamento de partidos e campanhas. Devemos estimular os cidadãos a participar cada vez mais, de maneira cívica e voluntária, do processo de financiamento de campanhas eleitorais.
O empresário Marcelo Odebrecht, um dos que fizeram delação premiada na Operação Lava Jato, disse que não existe campanha eleitoral sem caixa 2 no país. É possível esperar que um dia essa prática deixe de existir?
Márlon Reis - É totalmente possível esperar que haja, no futuro, campanhas sem o uso de caixa 2. O primeiro passo para que isso aconteça é que a sociedade de fato compreenda a gravidade dessa conduta e não tolere mais, denuncie e jamais volte a votar em qualquer um que tenha feito uso dessa prática. O caixa 2 é uma traição, um ato de deslealdade no processo eleitoral que deve ser duramente punido tanto do ponto de vista político, quanto do ponto de vista criminal. Quando amadurecermos o suficiente como sociedade para perceber isso, nos aproximaremos do fim desse desvio absolutamente inaceitável.
A proposta de lista fechada nas eleições contemplada dentro da proposta de reforma política é viável?
Márlon Reis - O sistema eleitoral de lista fechada, ou lista preordenada é caracterizado pela apresentação de uma lista de candidatos que é definida pelo partido e previamente apresentada aos eleitores. Os eleitores vão às urnas para votar apenas no partido, sabendo previamente quem são os candidatos que concorrem. Quanto mais votos o partidos obtêm, mais deputados elegem. Esse sistema é utilizado em diversas democracias avançadas; entretanto, entre nós, creio que não seria conveniente, porque não temos ainda um grau mínimo de democracia interna dos partidos. Correríamos o risco de essas listas serem compostas pelo critério exclusivo dos caciques partidários e ficariam pouquíssimas opções para os eleitores para definir com maior critério quem seriam os parlamentares. Nós defendemos um modelo alternativo. No projeto Eleições Limpas, apresentamos uma proposta de eleição proporcional em dois turnos. No primeiro turno se vota no partido, com isso se define o numero de cadeiras conquistadas; no segundo, o eleitor volta às urnas para escolher o candidato da sua preferência.
O que se pode esperar das eleições de 2018?
Márlon Reis - Estou otimista em relação às eleições de 2018. O que eu posso esperar é que a sociedade supere o momento de indignação e passe para a fase da ação, escolhendo racionalmente os seus candidatos. Precisamos aproveitar o fato de que não haverá o dinheiro das mega empreiteiras, desequilibrando os pleitos, como aconteceu nas ultimas eleições, especialmente nas de 2014. Vamos aproveitar o momento de eleições mais baratas para votar com mais sabedoria, escolhendo pessoas não com base em quanto possuem para apostar em campanhas, mas naquilo que, de fato, podem fazer como legítimos representantes da sociedade. Teremos pela primeira vez eleições em que podem ser escolhidos representantes do povo, e não representantes das empreiteiras.
Fonte: José Antônio Rosa/Cruzeiro do Sul
Foto: Ednilson Jodar Lopes/Arquivo JCS
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