Oncinha pintada, Zebrinha listrada, Coelhinho peludo, vão... Porque aqui na face da terra... Só bicho (...) é que vai ter!
Bichos (...) venham enfeitar... Meu lar! Meu jantar! Meu nobre paladar! (Titãs, Bichos...)
Somos pródigos em criar prisões e amarras, sempre tolhendo liberdades em nome de objetivos mal entendidos, porque propositalmente mal explicados. Entre todas, como mostra o filme Matrix, a prisão mais eficiente é a imposta à mente, pois ela embaralha o real e o imaginário, impedindo-nos de tomar atitudes racionais.
Em muitas ocasiões, o tabu vence a lógica, simplesmente por não sermos capazes de superar o que repetimos mecanicamente há tempos imemoriais. Criamos a barreira perfeita para impedir, até mesmo, mudanças de rumo absolutamente necessárias.
E é esta prisão que parece ter sido erigida na nossa sertaneja Apodi, em face das resistências a uma solução eficiente para um problema real e grave, não resolvido por anos a fio, tudo em virtude do imobilismo imposto por nossas amarras mentais.
Os danos decorrentes de jumentos soltos em nossas estradas – e diversos outros problemas diretos e indiretos causados pelo acentuado abandono desta tração animal – remontam há pelo menos 20 anos, sem que solução com racionalidade econômica tenha sido posta para enfrenta-lo efetivamente.
Inclusive, se quisermos um marco mais seguro para fixar desde quando este problema permanece sem solução, basta resgatarmos artigo publicado em 26 de maio de 2001 no jornal New York Times, assinado por Larry Rohter, então correspondente no Brasil - “Tenha pena do burro, um animal de carga que se tornou um fardo”. Naquela data, há 13 anos, o problema já era grave o suficiente para merecer a atenção de um dos mais conceituados jornais do mundo.
Imprescindível resgatarmos o referido artigo para localizarmos precisamente a origem do problema. Com a palavra, Larry Rohter e o New York Times: “Durante as décadas de 1970 e 1980, a população de jumentos do Brasil era estabilizada pelas exportações de carne, principalmente para o Japão e a França, onde a carne magra era especialmente apreciada. Porém, nesses mercados os países africanos desbancaram o Brasil, contando com a ajuda de grupos brasileiros defensores dos direitos dos animais que se opõem ao comércio de carne, e forçaram o fechamento de mais de uma dezena de matadouros” (tradução do próprio autor, no livro “Deu no New York Times: o Brasil segundo a ótica de um repórter do jornal mais influente do mundo”, Rio de Janeiro: Objetiva, 2008, pág. 387).
Vale dizer, em nome de um suposto direito dos animais – o direito é antropocêntrico, pois as normas se dirigem à pessoa humana, redundância proposital e constitucional – ou de um tabu, decorrente dos serviços prestados por aquele dócil animal, aceitaremos que seres humanos – estes bichos de pequeno valor e despertadores de pouca simpatia - morram de fome ou em acidentes nas estradas. E ainda abdicaremos de uma utilização econômica racional deste bem, além de suportar os custos de um armazenamento sem perspectiva de acabar e em expansão geométrica – hoje são 600 animais, amanhã serão 2000, depois de amanhã serão uma cidade de porte médio.
Ao olhar este quadro, acaso vivesse hoje, provavelmente George Orwell escreveria a “Revolução dos Bichos” dando um papel de destaque maior para o jumento, pois ele conseguiu que o homem passasse a trabalhar para ele, em uma espécie de aposentadoria pelos serviços prestados no passado, ainda que para isso tenha que abandonar os da sua própria espécie.
Por buscar uma solução em seu córtex pré-frontal – que só possuímos porque o homem das cavernas resolveu comer carne -, e não no coração, deveríamos contribuir com o promotor que quer estimular o consumo desta fonte de proteína, ao invés de impormos barreiras que brigam com a lógica.
Infelizmente, ainda não inventaram habeas corpus para as prisões mentais!
Fonte: Luciano Ramos - Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do RN/http://tribunadonorte.com.br/
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