Marcada para quarta-feira, a votação da segunda denúncia da Procuradoria contra Michel Temer tornou-se um jogo jogado. O presidente está salvo. Mas um grupo de mágicos do centrão, com ascendência sobre partidos como PR, PP e PSD, discute a sério a hipótese de fazer sumir parte dos 263 votos que livraram Temer da primeira denúncia. A ideia é impor ao presidente uma vitória mixuruca, obrigando-o a remodelar o governo. A prioridade do grupo é lançar ministros do PSDB ao mar, para ocupar-lhes as poltronas. Numa conta inicial, planejou-se o sumiço de algo como 40 votos. Lipoaspirado, o apoio a Temer seria reduzido à casa dos 220 votos. O suficiente para deixá-lo acima do mínimo necessário à rejeição da denúncia (172 votos), mas abaixo da maioria absoluta (257 votos), quórum exigido para a aprovação de projeto de lei complementar. E muito abaixo dos três quintos (308 votos), indispensáveis para a aprovação de emendas à Constituição. Nas pegadas do sepultamento da primeira denúncia —por corrupção passiva—, Temer convocou a imprensa. Estufando o peito como uma segunda barriga, jactou-se de ter obtido a maioria absoluta dos votos dos 513 deputados. Declarou que o placar assegurava ao governo as condições políticas para fazer ''as demais reformas estruturantes que o país necessita.''
Se o plano de seus aliados der certo, Temer sairá tão moído da votação da segunda denúncia —por formação de organização criminosa e obstrução à Justiça—, que não terá como fingir que ainda faz e acontece. Nessa hora, o centrão exigirá do inquilino do Planalto algo que seus líderes chamam de “repactuação do governo” —leia-se submissão radical aos apetites fisiológicos do grupo.
De todas as ilusões normalmente associadas à Presidência da República, a mais comum é a de que o presidente preside os rumos do país. No caso de Temer, a ilusão foi levada às fronteiras do paroxismo. Incapaz de projetar as aparências do poder, sua voz de comando não ecoa muito além dos limites do Palácio do Planalto. Fora da sede do governo, suas ordens se diluem num mar de interesses partidários. A máquina estatal foi, por assim dizer, inundada por práticas antirrepublicanas, numa escala jamais vista.
Ao farejar a fritura do centrão, Temer tenta saltar da frigideira antes de quarta-feira. Vem daí as declarações de amor do presidente à bancada ruralista. Vem daí também o desmonte do programa de privatização do governo. Temer já retirou do pacote o aeroporto de Congonhas. Fez isso para adoçar os humores de Valdemar Costa Neto, o condenado do mensalão que manda no PR. O partido controla a Infraero. Manda e, sobretudo, desmanda nos negócios aeroportuários. E Temer não pode dar-se ao luxo de trocar Valdemar pela inciativa privada.
Fonte: Josias de Souza/UOL
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