Quero que o sol não invada o meu caixão,
Para a minha pobre alma não morrer de insolação.
Quando eu morrer, não quero choro nem vela. Quero uma fita amarela gravada com o nome dela.
Se existe alma. Se há outra encarnação. Eu queria que a mulata Sapateasse no meu caixão. Não quero flores nem coroa com espinho, só quero choro de flauta, violão e cavaquinho.
Fita amarela, Noel Rosa
Qual a justa medida da homenagem àqueles que não estão mais entre nós? Certamente, não há fita métrica para quantificar a valorização da memória dos nossos antepassados, desde o âmbito familiar até os destaques de nossa sociedade.
Há aproximadamente um ano, morreu o mais notório representante do futebol potiguar. O eterno lateral esquerdo da seleção brasileira de 1974, até hoje detentor da proeza de ser o único nascido na terra de Poti a vestir a camisa canarinho em uma Copa do Mundo, despediu-se de nós com tímidas honrarias públicas em vida.
Sem dúvida, é inquestionável o destaque do seu nome. Mas, a pergunta a ser feita agora é: quanto dinheiro público deve-se empregar nesta homenagem? Ou melhor, é o dinheiro público que irá aliviar consciências pesadas por um reconhecimento tardio?
De fato, esta reflexão volta novamente à tona – já em 2014, publiquei artigo na Tribuna do Norte, “Marinho Chagas: o nome de R$ milhões” -, pois, mais um passo foi dado em direção à fixação do seu nome por lei no estádio ora denominado de Arena das Dunas – projeto de lei com este conteúdo acaba de ser aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte.
Embora não fosse caso de reprovação na CCJ, visto que não se há de falar em inconstitucionalidade do projeto, assusta o fato de ele seguir sem maiores alterações para apreciação do plenário do parlamento estadual.
Ocorre que, por opção do próprio estado, ao assinar um contrato de Parceria Público Privada em abril de 2011, não é sem consequências para o Erário esta atribuição de nome à Arena, como o seria a denominação de uma rua ou outro espaço público.
Não se trata de questionar se o estádio virou um espaço privado imune a leis que fixem seu nome. Obviamente, não é este o problema – basta ver o Aeroporto Aluízio Alves que também é uma concessão -, mas, o fato de ser o nome desta Arena um ativo incluído no plano de negócios que sustenta sua viabilidade econômica – por motivos simples de deduzir, o mercado não se interessa tanto em comprar nomes de aeroportos como os de estádios de futebol, como são os casos do Allianz Parque (privado) em São Paulo e as arenas Itaipava em Salvador e Recife, estas últimas parcerias público-privadas.
Então, cabe-nos refletir se é razoável abdicar da venda da exploração comercial dos direitos ao nome (naming rights) – limitações impostas unilateralmente desvalorizam ativos -, sendo de R$ 10 milhões a expectativa desta receita nos próximos 4 anos, com 50% deste valor revertido para o orçamento público.
Ou seja, a cada nova Copa do Mundo, R$ 5 milhões potencialmente deixarão de entrar nos cofres públicos, para que possamos ver gravado o nome de Marinho Chagas no estádio que já foi Machadão. Ideias não faltam para homenagens menos custosas, desde um “museu Marinho Chagas” dentro do estádio, até um “projeto social Marinho Chagas” com parcela dos recursos arrecadados com a venda do naming rights.
Na dúvida, pode-se até fazer uma jogada mais trivial, como fez o município de São Paulo, dando o nome de Parque Antártica à avenida onde se localiza a moderna Arena Allianz Parque, conciliando receitas, tradição e homenagens em uma proporção equilibrada.
Enfim, muito enfeite pode acabar se tornando um gol contra!
Fonte: Luciano Ramos é Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP e Procurador-Geral do Ministério Público de Contas do RN/http://tribunadonorte.com.br/
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