Cooperativas agrícolas que em 2010 receberam recursos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) financiaram campanhas de parlamentares com bom trânsito no Ministério da Agricultura, como o ex-ministro e deputado Reinhold Stephanes (PMDB) e o deputado estadual Baleia Rossi (PMDB), filho do atual titular da pasta, Wagner Rossi. Desde 2009, a Lei Eleitoral proíbe que cooperativas "beneficiadas por recursos públicos" façam doações a campanhas eleitorais. Com base nesse dispositivo, especialistas ouvidos pelo Estado apontaram como irregulares as contribuições das entidades que fizeram negócios com a Conab. As cooperativas, no entanto, têm outra interpretação: alegam que a lei não é específica e que não são "beneficiadas" com recursos públicos, pois recebem a verba por causa de uma relação comercial - a venda de alimentos para a Conab.
Levantamento feito pelo Estadão nas unidades da Conab que mais movimentaram recursos em 2010 - São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais - detectou pagamentos a 17 cooperativas agrícolas que financiaram candidatos. A pesquisa se restringiu às entidades que receberam pelo menos R$ 300 mil do governo federal no ano passado.
"Se uma empresa pode financiar uma campanha eleitoral, isso significa que terá representatividade no Congresso. É assim que funciona. Se as cooperativas não puderem participar (das doações), ficarão sem representação", afirmou o deputado Paulo Piau (PMDB-MG), vice-presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo (Frencoop).
"Não há dúvida de que essas doações não poderiam ter sido feitas", disse Alberto Luís Rollo, especialista em direito eleitoral. "Mas o prazo já passou para eventuais impugnações de candidatos." O advogado Tito Costa, que também atua na área, interpreta a lei da mesma forma: "Cooperativas que recebem recursos públicos não podem doar para candidatos".
Na eleição de 2010, as cooperativas contabilizadas pelo Estado contribuíram aos candidatos com R$ 1 para cada R$ 95 recebidos do governo. Ao todo, as entidades doaram mais de R$ 1,8 milhão para parlamentares e receberam R$ 179 milhões do Ministério da Agricultura como forma de pagamento pela compra de alimentos via Conab.
Até 2009, a lei proibia qualquer tipo de doação por parte das cooperativas. Uma mobilização dos ruralistas no Congresso levou à mudança na regra - ficaram impedidas de doar apenas as entidades "concessionárias ou permissionárias de serviços públicos" ou "beneficiadas com recursos públicos".
Para o presidente da Frencoop, senador Waldemir Moka (PMDB-MS), a discussão sobre as vedações na lei são de ordem "jurídica, não política". "Não havendo impedimento, não há nenhum problema nas cooperativas influenciarem a eleição por meio dos seus representantes."
A Cooperativa de Cafeicultores e Agropecuaristas (Cocapec) recebeu da Conab R$ 24 milhões no ano passado. A entidade participou da campanha eleitoral de 2010 doando cerca de R$ 250 mil para sete candidatos a deputado, entre os quais Baleia Rossi, filho de Wagner Rossi - que assumiu o Ministério da Agricultura em abril daquele ano. Ele recebeu R$ 33 mil.
Reinhold Stephanes, que comandou o Ministério da Agricultura entre 2007 e 2010, quando se desincompatibilizou para disputar a eleição, recebeu R$ 90 mil de três entidades: Cooperativa Agropecuária Castrolândia, Cooperativa Agrícola Mista São Cristovam e Capal - Cooperativa Agroindustrial. Ao todo, elas receberam R$ 16 milhões do ministério no ano passado.
Além de peemedebistas, cooperativas também beneficiaram candidatos de outras legendas. A Cooperativa Agroindustrial (Cocamar), que recebeu R$ 849 mil da Conab em 2010, fez doações de R$ 40 mil à campanha para o Senado da atual ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann (PT), e de R$ 50 mil a Beto Richa (PSDB), candidato ao governo do Paraná.
Durante a campanha de 2010, as cooperativas se organizaram para aumentar a bancada de apoio no Congresso, hoje formada por 224 deputados e 26 senadores. Foram realizados seminários para apresentar os candidatos que contavam com o apoio do segmento.
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