O que assusta nos áudios de Fabrício Queiroz jogados no ventilador é o poder de corrosão. O discurso moralizador da família Bolsonaro já está bem oxidado. Mas a reação tíbia às falas de Queiroz dá novo viço à ferrugem. As respostas que Jair Bolsonaro e seu primogênito Flávio não têm condições de dar corroem mais do que as insinuações que Queiroz já não faz questão de ocultar.
Nos áudios içados do WhatsApp para as manchetes, Queiroz encosta nos Bolsonaro algo muito parecido com um plano de rachadinha federal —"Tem mais de 500 cargos lá, cara, na Câmara, no Senado…"—; queixa-se de abandono —"Não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar…"—; e manda para o espaço seu destino e o futuro da primeira-família —"O MP tá com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente".
Instado a reagir quando a primeira gravação veio à luz, Jair Bolsonaro passou a impressão de que já não preside os acontecimentos, subordina-se a eles. "Áudio bobo", disse o capitão. "Não converso mais com ele". E Flávio, na mesma linha: "Não tenho mais nenhum tipo de contato com ele há quase um ano".
Atônitos, pai e filho medem as palavras na escala dos milímetros. Esforçam-se tanto para não melindrar Queiroz que acabam ultrapassando a fronteira que separa o constrangedor do patético. O problema não é o suposto distanciamento de "quase um ano", mas a proximidade de mais de três décadas com um personagem tão desqualificado. Jair Bolsonaro manteve com Queiroz uma amizade de 35 anos. Flávio serviu-se da assessoria do personagem por 11 anos. Agora, a despeito dos milhões de indícios em contrário, a dupla acha que não deve nada a ninguém. Muito menos explicações. Como disse Queiroz num dos áudios tóxicos, "era para a gente ser a maior força, a gente. Está todo mundo temendo, todo mundo batendo cabeça".
Em ambientes assim, marcados pela conturbação, a bateção de cabeça tende a se tornar um problema menor quando evolui para a fase em que certas pessoas ficam tentadas a bater com a língua nos dentes.
Fonte: Josias de Souza/UOL
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