Ainda não cheguei ao pedaço desse Brasil alternativo onde se encontram os 10,7% totalmente imunizados. Mas o primeiro estágio da migração já foi uma experiência fabulosa. Por alguma razão, não consigo festejar como gostaria. Oscilo entre o desconforto e o receio. Sinto-me desconfortável ao lembrar dos 77,5% que ainda não chegaram nem à primeira dose. Fico receoso porque minha segunda dose foi marcada para 30 de agosto. E não tenho a certeza de que ela estará lá nesse dia, à minha espera.
O que distingue a mudança de fases na evolução humana é o que o homem considera bom mesmo em cada estágio da existência. Não apenas bom. Melhor do que tudo. Bom mesmo. Depois de mais de um ano de home office e isolamento, eu estava me sentindo mais ou menos como um figurante —daqueles que apareciam no final da relação dos personagens numa peça de Shakespeare: "mendigos, feirantes, etc..." Eu era um etcétera do enredo das vacinas. Até algumas horas atrás, bom mesmo para mim era a primeira dose.
Na fila, me dei conta de que bom mesmo é tomar a vacina junto com a mulher amada. Temos, eu e minha doce Liliane, a mesma idade. Deixei o posto de vacinação em outro estágio, feliz como uma criança que recebe o presente desejado. Para um menino, bom mesmo é mãe. Lembrei do tempo em que minha mãe transformava cada vacina numa aventura. Imunizado, eu viraria super-herói, não jacaré.
À espera da terceira onda e da segunda dose, chego à conclusão de que bom mesmo seria ter de volta aquele Brasil em que vacina era algo corriqueiro e cloroquina era apenas um remédio ótimo para o tratamento do lúpus e malária. Bom mesmo é a racionalidade.
Fonte: Josias de Souza/UOL
Foto: Pedro Ribas/SMCS
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