“A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu/A lua cheia que vivia escondida surgiu.Minha cidade toda se enfeitou pra ver a banda passar cantando coisas de amor.
Mas para meu desencanto/O que era doce acabou/Tudo tomou seu lugar/Depois que a banda passou.
E cada qual no seu canto/Em cada canto uma dor/Depois da banda passar/Cantando coisas de amor”.
(A Banda, Chico Buarque).
Brasileiros que somos, não nos acostumamos a ser convidados para os banquetes mundiais, ao menos não como convivas. Ora serviçais, ora primo pobre convidado por educação, sempre almejamos com olhos lânguidos sentarmos à mesa dos ricos, ou até mesmo sermos anfitriões de grandes eventos, para podermos deleitar dos manjares que sentíamos o cheiro e sonhávamos, como aquele que comia feijão e imaginava-se príncipe, antes de flutuar no ar e morrer no chão da realidade de Chico Buarque.
Aí surgiu a nossa vez, pois a banda FIFA resolveu cantar-nos coisas de amor. Realizaríamos uma Copa do Mundo como nunca se viu (e uma Copa das Confederações de lambuja), com as benesses de uma democracia imberbe, bem ao gosto duvidoso de alguns dirigentes, como recentemente declarado. Para ouvir a banda tocar, bastaria arcar com alguns míseros bilhões para a estrutura, notadamente arenas transformadas magicamente de maquetes em candidatas a elefante branco, sem se preocupar se o país já não teria estádios em demasia.
Mas como a banda estava contratada, não poderíamos deixá-la sem sua estrutura, e o palco já está quase todo montado com arenas concluídas a toque de caixa ou em vias de serem concluídas na undécima hora. Pronto, habemus estádios e jogos. Mobilidade, e coisas que tais, depois se vê em um nebuloso pós-Copa, marco redentor de nossa sociedade.
Infelizmente, achávamos que bastaria o custo bilionário dos estádios, tal qual um consumidor inebriado que confere a conta e se esquece de computar a taxa de serviço, que, gostando ou não, terá que pagar, acaso não queira brigar com o estabelecimento todo poderoso. E eis que a FIFA apresentou a taxa de serviço, na forma de adicional ao contrato, no qual os estados se comprometeram a bancar além dos estádios, as estruturas temporárias do seu entorno, que serão desmontadas logo após a banda passar.
Ou seja, neste almoço da FIFA que estamos pagando, há uns extras que as cidades-sede da Copa das Confederações só vieram perceber a poucos meses de abrir a casa para a festa, pois além dos imóveis, teremos que oferecer enormes tendas com all inclusive, com diversos mimos para o convidado de honra, entre eles espaços para os VIPs e os VVIPs. Ocorre que a mordomia tem seus caprichos, e o custo médio para estas estruturas temporárias por sede da Copa das Confederações vai em R$ 30, R$ 35 milhões, isto porque a FIFA aceitou vir jantar conosco com acomodações mais tímidas, quando viu que o orçamento médio inicial passava de R$ 100 milhões e que este preparativo para a grande festa está mais para uma feijoada nacional, uma vez que 98% dos ingressos para a Copa das Confederações foram comprados por brasileiros.
Mas tudo será diferente com a grande rave de 30 dias que faremos em 2014, aí já não é tão certo que vão aceitar “economias” com o grande banquete, e deveremos ser chamados para pagar a conta cheia, com todos os extras que a FIFA tem direito, com os custos externalizados para o Brasil.
No caso das estruturas temporárias, aquelas grandes tendas que vimos na frente dos estádios da Alemanha e da África do Sul, o custo não será exatamente transferido para o Brasil, pois foram os estados-sede da Copa do Mundo que se comprometeram a bancar a brincadeira, que coincidirá com o final do mandato dos governadores.
Diante de todos estes preparativos e custos para ver a banda passar, deveríamos indagar se depois dela ainda teremos recursos para bancar obrigações menos lúdicas, como folha de pagamento e serviços essenciais, sobretudo em um Rio Grande do Norte que já não está com muita sobra de caixa para as despesas diárias, quanto mais com esta despesa extra pouco planejada. Como caminhará a economia após todo este endividamento público?
Fonte: Luciano Ramos - procurador-geral do MPJTCE/RN; mestre em Direito do Estado pela PUC/SP, via Tribuna do Norte
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