Esta reportagem ocupa quatro das 84 páginas da edição de dezembro da Revista Congresso em Foco. O jornalista catarinense Fábio Bispo entrevistou dezenas de pessoas, durante semanas, para produzir um rico relato da tragédia e do perfil do reitor que, ao se matar, deixou claros erros primários cometidos pela Polícia Federal e pelo Judiciário.
Quando mergulhou no vão central do quinto andar do Beira-Mar Shopping, em 2 de outubro,em Florianópolis, Luiz Carlos Cancellier de Olivo, 60 anos, deixou um único recado escrito à mão: “Minha morte foi decretada quando fui banido da universidade”. O texto era guardado pelo professor na jaqueta de couro que ele vestia sobre uma camiseta da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), da qual era reitor.
Desde sua prisão pela Polícia Federal na Operação Ouvidos Moucos, em 14 de setembro, Cancellier era só tristeza. A prisão, que durou apenas um dia, veio acompanhada da proibição judicial de acessar o campus da UFSC. O “reitor exilado”, como se autointitulou em artigo publicado no jornal O Globo quatro dias antes de seu suicídio, voltou à Reitoria dentro de um caixão, recebido sob aplausos por uma multidão.
O barulho causado pela morte de Cancellier atravessou os corredores da sexta maior universidade do país, uma comunidade de 50 mil pessoas. Entidades das mais diversas áreas e políticos de diferentes partidos se uniram em críticas ao que chamaram de “excesso”, “autoritarismo” e “arbitrariedade” do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal. O discurso também foi utilizado politicamente por parlamentares enrolados até o pescoço na Operação Lava Jato, que tentaram se comparar ao reitor no papel de vítima.
A responsável pelo pedido de prisão, a delegada Erika Mialik Marena, virou alvo de um procedimento da própria PF que apura “abusos e excessos cometidos na Operação Ouvidos Moucos”, após o irmão de Cancellier, Acioli Antônio de Olivo, e o advogado Hélio Rubens Brasil entregarem representação ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim, em 31 de novembro. A delegada que batizou a Lava Jato e que comandava o setor de repressão à corrupção e crimes financeiros em Santa Catarina chegou a ser promovida, no dia 1º de dezembro, para ocupar a superintendência da PF em Sergipe, afastando-se de vez do caso ainda na fase de inquérito. Mas a nomeação foi suspensa pelo novo diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segovia.
O mergulho no vão do principal shopping da capital catarinense pôs fim à vida de um acadêmico de trajetória acidentada e meteórica. Cau, como era chamado pelos amigos, chegou a Florianópolis aos 19 anos, em 1977, para cursar Direito na UFSC. Natural de Tubarão, no sul do estado, filho de um lavador de carvão da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e de uma costureira, Cancellier morou na casa de amigos para driblar as dificuldades financeiras na capital.
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Foto: Jair Quint / UFSC
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