Um dos integrantes do grupo político de Eduardo Cunha contou ao blog que foi negociada com o Palácio do Planalto a “estratégia” que incendiou a Câmara nesta quinta-feira (19). Na noite da véspera, emissários de Cunha estiveram com o ministro Jaques Wagner (Casa Civil). Pediram-lhe que assegurasse a ausência dos três representantes do PT no Conselho de Ética da Câmara. A ideia era esvaziar o colegiado, para adiar a votação do parecer do relator Fausto Pinato (PRB-SP), que recomenda a continuidade do processo de cassação do mandato do presidente da Câmara.
Conforme solicitado, o trio de petistas juntou-se à infantaria de Cunha e não deu as caras na abertura do Conselho de Ética. Um deles, o deputado Léo de Brito (AC), voou para Rio Branco. Os outros dois, Valmir Prascidelli (SP) e Zé Geraldo (PA), entraram no esconde-esconde pró-Cunha. Marcada para as 9h30, a sessão do conselho penou para completar o quórum mínimo. Exige-se a presença de pelo menos 11 dos 21 membros. Esse contingente foi alcançado apenas às 10h23.
Só então, diante do fato consumado, os petistas Valmir Prascidelli e Zé Geraldo, que se encontravam na Câmara, deram o ar da graça. A tática da ausência deixara de fazer sentido. Cunha cuidou de acionar o seu “Plano B”. Às 10h44, ele abriu a sessão deliberativa do plenário da Câmara, tornando obrigatório o encerramento das atividades nas comissões e no Conselho de Ética.
Instado por seus próprios aliados a anunciar a interrupção das atividades extra-plenário, Cunha soou assim no microfone: “Qualquer comissão que esteja funcionando está funcionando de forma irregular. Toda e qualquer deliberação é nula. Qualquer deliberação após 10h44 será nula.''
Sem alternativa, o presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PSD-BA), teve de suspender os trabalhos. Mas avisou que reiniciaria a sessão depois do término das votações no plenário da Câmara. Para evitar que isso ocorresse, Cunha e sua infantaria executaram uma manobra dentro da outra.
Cunha transferiu a presidência da sessão para o Segundo Secretário da Mesa Diretora da Câmara, Felipe Bornier (PSD-RJ). Que declarou nula a reunião do Conselho de Ética. Foi como riscar um fósforo para iluminar o interior de um tonel de gasolina. O plenário da Câmara, que já estava inflamado, explodiu. Instado a revogar a decisão do preposto Bornier, Cunha negou-se a fazê-lo. Ouviu ataques e desqualificações em série.
Em reação inédita, algo como uma centena de deputados deixou o plenário entoando gritos de “vergonha, vergonha” e “fora Cunha”. Entre os sublevados estavam alguns petistas alheios às orientações do Planalto. Por exemplo: o ex-líder do governo Henrique Fontana e a ex-ministra Maria do Rosário, ambos do PT gaúcho. A maioria dos revoltosos rumou para o Conselho de Ética, que realizou uma sessão de autodesagravo, marcando para terça-feira da semana que vem a votação do parecer que Cunha gostaria de ver engavetado.
Entre os emissários de Cunha que conversaram com o ministro Jaques Wagner estavam dois generais da tropa do presidente da Câmara: Jovair Arantes (GO), líder do PTB; e André Moura (SE), líder do PSC. A negociação foi testemunhada pelo líder do PT, deputado Sibá Machado (AC).
A conversa ocorreu na mesma noite em que Lula, em entrevista ao repórter Roberto D’Ávila, disse coisas assim: “Tem uma crise política que está difícil de resolver. A Dilma refez agora o ministério, repactuou com a sua base, parecia que estava tudo normal. Repactuou com o PMDB, trocou ministros. Mas me parece que o Eduardo Cunha ainda tem um poder muito grande dentro da Câmara.”
Lula prosseguiu: “O líder do PMDB [Leonardo Picciani, do Rio] parece que não tem a força que parecia que tinha. Os líderes não têm a força que parece que têm. Porque antigamente, você resolvia isso conversando com o ministro. E o ministro de cada partido entregava os votos [no plenário]. Depois, você conversava com o líder. E os líderes entregavam os votos. Hoje, não tem mais essa representatividade. Os presidentes não mandam mais nos partidos. Os ministros não coordenam mais suas bases. E os líderes também não.”
Tomado pelas palavras, Lula, padrinho da nomeação de Wagner para a Casa Civil, parece acreditar que não há alternativa para Dilma e seus auxiliares senão procurar o Eduardo Cunha, negociar com o Eduardo Cunha, ceder às conveniências do Eduardo Cunha. O mesmo Eduardo Cunha que a Procuradoria da República denunciou ao STF por receber propinas extraídas do cofre da Petrobras durante o governo Lula.
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