Não, não me venham dizer que tudo começou agora, que a corrupção esteve distante da cozinha do poder, em tempos de Brasil alheio ao Lulismo. Por outro lado, de mim não esperem a passividade que um dia aprendi que seria alienação política. Não, não me apetece, absolutamente, vedar os olhos, tampouco me estupefar como se vivêssemos algo completamente novo, o extraordinário.
O Brasil atravessa um momento delicadíssimo.
Um mar de lama transborda de dentro para fora e de fora para dentro do Governo Federal, deixando um rastro de incertezas sobre o que restará de uma nação que tenta aprender sobre democracia, imersa em escândalos de corrupção e desvios do que é público em favor do privado.
A lama degrada, envergonha, forma crostas alimentadas por esquemas de corrupção, tão antigos quanto possa ser considerada a nossa jovem República. Ao brasileiro tem restado o sentimento de vergonha e revolta, especialmente quando se verifica a facilidade com que alguns acumulam riquezas, edificam projetos de perpetuação no poder, desfrutam de mordomias, cativam o que um dia foi objeto de indignação pública.
Nas eleições de 2014, as urnas deram os seus recados e por muito pouco não ocorreu alternância de poder. Presenciou-se a mais autêntica forma de protesto, realizado por quase 50% dos eleitores brasileiros. Porém, carece não esquecermos que o movimento das urnas nasceu nas ruas, nas manifestações que eclodiram de norte a sul do país, ainda em 2013. Passadas as eleições, o sentimento de indignação retornou aos grotões reais e virtuais, embora sem a mesma vitalidade de antes.
Tenho uma hipótese: parte das situações vexatórias impostas ao Brasil é sustentada pela histórica prática de rateio de cargos públicos, objetivando acomodar políticos sem mandatos, parentes e afilhados de lideranças partidárias ou de financiadores de campanhas. É evidente que aqui eu não generalizo, absolutamente, apenas realço o grau de implicação dessas pessoas com quem as protege. Elas são milhares, espalhadas por todo país, um verdadeiro exército pronto para seguir uma espécie de cartilha de práticas pouco republicanas.
Velhas práticas se perpetuam. Os cargos comissionados e as funções gratificadas são tantas que a cada suposta exoneração, apenas ocorre troca de nomes. Salvo exceções, saem uns e assumem outros “convertidos”, dispostos, no mínimo, a defenderem que os indicou. Assim, segue o Brasil: refém da lentidão da Justiça e dos órgãos de controle. A impunidade e os vícios prosperam, o ciclo se refaz.
Do mesmo modo, se mostra perverso o quadro de subserviência do Legislativo em relação ao Executivo. Em nome de manter a maioria em votações polêmicas e evitar, por exemplo, as instalações de CPIs, o Governo faz concessões aos parlamentares “aliados”. Comenta-se que as ofertas, no âmbito do toma lá-dá-cá, envolvem, sobretudo, obras e cargos.
Reforço o que já escrevi outras vezes: a superpopulação que ocupa cargos comissionados na gestão pública é um emblema do atraso, por serem os cargos transitórios e viciados na forma grotesca com que são criados, negociados, rateados e até extinguidos, sugerindo pertencimento à esfera privada dos gestores e concatenados com escolhas político-partidárias.
A “limpeza” que precisa ser feita nas entranhas do Brasil é tão urgente quanto o é a necessidade de emergirem lideranças novas, tocadas pela urgência de se promover a educação política da população. É de autonomia e decência, no pensar e no agir, que estou a falar.
*Professora, especialista em Psicopedagogia, Mestre e Doutora em Educação. Diretora Executiva do Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE) e Coordenadora do “Esquina do Conhecimento, projeto pedagógico da Escola Estadual Manoel Dantas. É articulista de temas relativos à Educação e no ano de 2014 passou a publicar, também, minicontos de amor, crônicas e poemas que são tentativas de incursão pelo universo do texto literário.
Fonte: Cláudia Santa Rosa/http://www.marceloabdon.com.br/
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