Há um pensamento em voga entre nós: devíamos sabotar a Copa, torcer contra, colaborar para que “não haja” Copa. Isto seria a coisa cívica e correta a fazer – usar a Copa do Mundo no Brasil não para vender ao mundo uma imagem boa do país, mas, ao contrário, para revelar nossas mazelas, para admitir nossas iniquidades diante do planeta.
Isto seria um levante contra “tudo isso que está aí” – o maldito padrão Fifa que não conseguimos alcançar e que nos humilha; nossa incapacidade histórica de fazer qualquer coisa honestamente, sem cobrar ou pagar propina; a economia que não anda; nossa ineficiência estrutural e nossa leniência crônica que nunca cumprem o que promete, que perdem prazos e desrespeitam contratos; nossa falência como nação que não consegue andar para frente em tantos aspectos essenciais; nossa incompetência em superar essa fenda social profunda que nos divide há séculos em duas castas que se odeiam, às vezes em silêncio, às vezes nem tanto.
Mas sabotar a Copa funcionaria também como uma espécie de autoexpiação pública e mundial, transformando nossas questões nacionais, internas, num inesquecível fiasco global. Como se a Copa do Mundo deixasse de ser uma festa para virar uma chibata. Como se o maior evento do planeta, que nos foi confiado e que nós brigamos para receber, não representasse um momento de alegria mas sim uma oportunidade de gerar constrangimento, vergonha, decepção e má publicidade.
Sorrir virou uma assunção de cretinice. Torcer pelas cores nacionais na Copa virou um crime. Exercer o gosto pelo futebol, um traço nacional, virou coisa de gente pusilânime.
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Fonte: Adriano Silva/Manual de Ingenuidades/http://www.diariodocentrodomundo.com.br/
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